
Chorei e pensei duas vezes, aliás, muito mais: fiquei sete dias e sete noites pensando se publicava ou não a continuação da biografia não muito autorizada do “Cobra Parada Não Engole Sapo”. E não continuaria, não fosse, como diria meu confidente e amigo pessoal, Paulo Coelho (que começou a escrever “Diário de um Mago" ao ver a interpretação do Panta como Mago em “O Homem que Usava Cabeça de Papelão”), o Universo ter conspirado. Quando algo de bom, belo, verdadeiro e justo tem que acontecer, o universo conspira para que aconteça. E assim aconteceu. O universo e o bom Deus conspiraram (o mau Deus, também conhecido como “o coisa ruim”, não é aceito nas rodas que decidem o destino dos homens de bom coração, como eu), e na noite do sábado o Luiz, que andava muito sumido, procurava na Internet o seu passado, quando se deparou com este blógui, virou seguidor e me autorizou a contar sua mini-biografia não autorizada, o que me deu ânimo para continuar a escrever a verdadeira e incrível história do CPNES, cuja atuação no início dos anos 80 mudou a cara de Brasília, do Brasil e, por conseqüência, do Mundo, no campo das artes, da política e da filosofia... Vamos lá.
Luiz Gonzaga, doravante chamado de Gonzaguinha foi, na infância, membro do clube-mirim do DOPS (Delegacia da Ordem Política e Social – pasmem, sobrinhos, isso existiu). Filho de militares (só seu pai era militar, mas valia por dois), freqüentava, nos anos 60, a creche instalada na seccional do DOPS de Recife, que abrigava filhos dos militares, enquanto estes convenciam presos políticos tímidos a falar. Gonzaguinha cresceu praticamente dentro do DOPS. Sua juventude não foi primavera florindo caminhos.

Os gritos nas salas do subsolo eram, sim, dos presos, mas não passava de teatro. O filho do Gonzagão, o Gonzaguinha, é quem, ainda adolescente, dirigia a cena e maquiava os “torturados”, que saíam da “sala de massagem” com manchas e chagas falsas em tudo que é parte do corpo. Gonzagão passava ao Gonzaguinha fotos de torturados e ele maquiava os presos. Chegaram até a forjar a morte de alguns, ajudando-os a mudar de identidade e fugir para algum lugar seguro.
Quando começou a distensão e o afrouxamento das práticas de exceção, Gonzaguinha ficou sem ter o que fazer por lá. Queria alçar vôo e atuar onde ainda houvesse repressão e injustiça. Assim foi que seu pai conseguiu que ele fosse o informante da repressão (falso informante, é óbvio) na escola militar de administração de coisas que voam de um lugar para outro, onde estávamos nós, os cobraparadistas. Não sabíamos nem que ele era informante da repressão, nem que na verdade não o era, se é que vocês me entendem.
Gonzaguinha nunca contou nada, com receio de que algum de nós fosse um informante real da repressão. Como informante, tudo o que ele contava aos coronéis é que, no geral, éramos apenas um grupo de jovens imaturos, que brincava de ser politizado, mas que só queria se divertir. Contudo, para continuar no grupo, onde ele se divertia como nunca na vida, contava que desconfiava que um de nós fosse ativista de esquerda, e que precisava ficar por perto para descobrir. Nunca descobriu, mas se divertiu e divertiu as platéias.
Eu sei que alguns não acreditarão nisso (os mesmos que não acreditam no telefonema do Herby), mas eu pergunto: por que barba e bigode eram proibidos a todos os alunos, menos ao Gonzaga, que desde o início ostentou seu imenso e austero bigode? Sabem por quê? Agora eu sei: os coronéis eram péssimos fisionomistas e queriam reconhecer de longe seu informante.
E assim o Gonzaguinha chegou, com sua experiência, talento e heroísmo, ao Cobra Parada, do qual foi membro constante, embora não ligado diretamente aos cabeças do movimento, se é que o movimento teve cabeças e, evidentemente, se é que houve um movimento.
Seu primeiro papel foi do médico do reino da Reinolândia, que atendeu o Rei após este ter um mau-súbito ao saber que a princesa estava grávida de um súdito, este interpretado pelo Tiba, que até como personagem era irresistível. Depois, Gonzaguinha fez dois personagens em “O Homem que Usava Cabeça de Papelão” e ainda interpretou o temível e tosco Chico (acho), na mítica “A Morte de Humberto Laraia”.
Gonzaguinha demorou a se encontrar, pensando que não tinha mais contra o que lutar, assim que acabou a ditadura. Mas logo percebeu que mudara apenas a forma de violência. Hoje, o paladino Gonzaguinha, o Guerreiro Menino, ainda luta, com ou sem seu austero e másculo bigode, a favor da beleza e da justiça em algum lugar deste país.
Um comentário:
Ei,"Moça".... nunca pensei que vc soubesse quem fez o Coronel Botto de Barros nos fazer uma visitinha e de uma vez só descobrir quem eram os membros do perigoso grupo CPNES que tanto os ameaçava....
Um abraço, Gonzaguinha
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