sábado, 19 de fevereiro de 2011

A Incrível História do CPNES - Parte 15

PEPPERONI - A MÁFIA E A ENTRADA DO SALAME ITALIANO NO COBRA PARADA

O CPNES, com aquela conturbada e tensa, embora divertidíssima, estréia, de fato passou a existir. Não é por outro motivo que a maioria dos historiadores, os pesquisadores do tempo, os jornalistas e demais vasculhadores culturais e políticos, tem como certa a data de dezoito de maio de 1983 (veja ao lado a prova domunental) como o nascimento do Cobra Parada Não Engole Sapo. Em outros pontos, entretanto, há muita discordância, como quanto ao exato grau de influência do grupo na queda do regime militar e nos movimentos artísticos da época, como o boom do rock brasileiro (nascido, como todos sabem, em Brasília). Uns dizem que foi grande, outros chamam estes de malucos e dizem que não houve influência alguma.



Este autor, escravo dos fatos, prefere não se posicionar, mas apenas, e então somente, levantar os fatos ocorridos durante o período que compreende a gênese, a ascensão e o fim do grupo. Note-se que mencionei ascensão e fim, sem passar pela queda, porque simplesmente não houve queda. Tal qual Pelé, e ao contrário do Ronaldo, o Cobra Parada parou no ápice, não tendo experimentado o amargo sabor da queda. Talvez seja esta a razão de sua transcendência, da sua perpetuação, de ter virado mito.


Por isso a importância deste depoimento, dessas memórias contidas na Incrível História do CPNES, grupo do qual este autor, devo lembrar, foi participante ativo, embora muitos suspeitassem que fosse passivo. Afinal, essa gente de teatro...


Ativo ou passivo, uma coisa é certa: não há nesta “Incrível História do CPNES”, desde o primeiro capítulo, até este, o décimo quinto, e não haverá nos próximos, um único fato que não seja a mais pura acepção da verdade. Assim, pretendem estas modestas e bem escritas memórias servir de base para estudos de historiadores sérios e isentos que, comparando com os fatos da época, determinar a real influência do Cobra Parada, cuja atuação no início dos anos 80 mudou a cara de Brasília, do Brasil e, por conseqüência, do Mundo, no campo das artes, da política e da filosofia...


E por falar em fatos, fato é que a fatídica estréia do Cobra Parada contou com algumas participações especiais. Algumas especialíssimas, como por exemplo, a participação ativa de um gaúcho, por mais paradoxal que possa ser essa frase, vez que gaúchos não constam no imaginário brasileiro exatamente como ativos...



Os juízes em mural - homenagem do povo itliano
 Ativo ou passivo, o fato é que na Itália, no início dos anos 80, os juízes Paolo Borsellino e Giovanni Falcone começam a maior ação de investigação sobre a máfia italiana, que culminou em centenas de prisões e no conseqüente desmantelamento da mais que centenária instituição criminosa. No início dos anos 90 ambos foram mortos em atentados e são considerados heróis na Itália.


Mas voltando ao início dos anos 80, justamente no período em que os juízes iniciavam uma incrível e inédita perseguição aos mafiosos, aportava no Brasil, mudando-se às pressas, trazendo apenas as roupas do corpo, uma família italiana, mais precisamente napolitana, os Pepperoni.


Não vai aqui, Deus (assim, com letra maiusculíssima em sinal de temor e respeito) é testemunha, nenhuma intenção de insinuar que a nobre família Pepperoni fosse mafiosa. Longe disso. Na verdade, os mafiosos, eméritos glutões, adoravam ir ao restaurante, simples, porem digno e acolhedor, dos Pepperoni, onde comiam a se fartar os famosos picantes napolitano do salsiccia, um sausage de carne de porco seco picante de Nápoles, uma espécie de salame que misturava carnes suína e bovina, bastante apimentado. 

Pois como os mafiosos não saíam do restaurante dos Pepperoni, o patriarca, produtor do tal salame e filatelista profissional, temendo ser acusado de acobertar e dar guarida aos chefões do crime organizado, julgou mais prudente fugir para este acolhedor país, até porque não saíam mais da frente de sua casa/restaurante agentes federais italianos, querendo investigá-lo, e matadores da máfia, esperando uma oportunidade para calar definitivamente toda a família, que certamente ouvira muitas conversas e podia vir a ser inconveniente.


Temendo, com toda razão, policiais e bandidos, a família um dia fingiu que ia comprar cigarro no bar da esquina e nunca mais voltou. Além da roupa do corpo, trouxeram apenas um grande carregamento daqueles picantes napolitanos do salsiccia, que haviam despachado para o porto na véspera. Sua intenção era pegar um navio para o Rio de Janeiro, porque era uma cidade alegre, mas ao comprar passagem imaginaram que aquele porto alegre em que desembarcariam seria na cidade maravilhosa. Qual não foi sua surpresa ao desembarcarem a milhares de quilômetros, na capital do Rio Grande do Sul.


Na verdade, tiveram sorte, porque ao abrirem um singelo restaurante, verificaram que os gaúchos adoravam um bom salame...


É bom aqui fazer um parêntese: ao dizer que os gaúchos adoravam um bom salame não faço, em absoluto, qualquer alusão ao aspecto fálico da especiaria, nem tampouco a qualquer eventual característica peculiar do bravo, ativo e viril povo gaúcho.


Ativo ou passivo, o fato é que os gaúchos adoraram o tal picante “napolitano” do salsiccia, mas, achando aquele nome muito comprido, passaram a chamar aquela deliciosa iguaria de pepperoni. Semelhante metonímia ocorreu com iguaria criada por um bauruense conhecido por Bauru, que se transformou no famoso sabduíche Baurú.


Assim, os Pepperoni introduziram o pepperoni no Brasil. Assim foram enriquecendo, ou ao menos ficando em situação confortável. Mas o velho Gaetano, o patriarca, e seus filhos adolescentes, não queriam que se repetisse a história da Itália, não queriam nunca mais calar diante da opressão. Pelo contrário, decidiram que lutariam contra a ditadura. Foi aí que um de seus filhos teve a idéia de ir à Brasília, de entrar como estudante numa escola militar e lá ver o que podia fazer. E lá caiu estava o jovem Pepperoni, ao lado dos membros do Cobra Parada, aos quais resolveu se aliar, fingindo-se de gaúcho, o que, aliás, faz até hoje, vestindo com suposto orgulho uma camisa azul e preta e falando muito, e falando muito alto e falando muito grosso.


E lá estava o Pepperoni, na estréia do Cobra Parada e em tudo mais que fez o grupo. Lá estava o Pepperoni, emprestando ao grupo sua potência vocal, sua inteligência lógica virginiana, sua figura imponente de filho da aristocracia, sua cultura européia, sua musicalidade, seu senso de justiça, sua loucura verborrágica e sua falsa empáfia gaúcha. Lá estava o Pepperoni, primeiro pelo objetivo revolucionário, depois pelo afeto ao grupo e ao autor destas singelas memórias, que, diga-se, lhe tem o mesmo afeto, por sinal ainda crescente.

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