Em 86 estava no meio do badernaço de Brasília, dirigindo meu fusca 76, levando a pequeníssima Tani, 1 ano e pouco, no banco de trás. Íamos da Asa Sul pra a Asa Norte, pela L2. Quando atravessava o viaduto sobre o Eixo Monumental, um militar mandou parar. Naquele fim de tarde tudo estava envolto em fumaça. Pessoas correndo, militares por todo lado. A visão da esplanada era horrível: fogo, correria, cavalos, tanques (ou coisa parecida). E eu no carro parado, ali no meio daquilo, morrendo de medo, com a Tani atrás e o desespero no banco ao meu lado, espreitando, aguardando o momento oportuno para entrar dentro de mim. Entrar do ponto de vista espiritual, ou imaterial, afinal, o desespero não é feito de carne e osso. Material ou imaterial, eu precisava evitar que o desespero tomasse conta de mim. Olhava para trás e via os olhinhos da Tani, assustados com todo aquele movimento e barulho. Respirei fundo e olhei para frente. Aí então eu vi o que estava ali, bem na minha frente: a história. Era 28 de novembro de 1986.
Muito antes, 1969 foi um ano em que senti o mesmo duas vezes. Uma vez em 20 de julho, quando o mundo parou para ver Neil Armstrong, um trompetista que também era astronauta, pousar na lua. Naquele dia ele compôs a magnífica “Wonderful World” ao olhar para a terra e constatar que era azul, embora a terra fosse, e na verdade ainda o é, verde. Armstrong e o pessoal da NASA não se ativeram ao fato de que o visor do escafandro, sendo marrom, transforma em azul o verde. Não tenho certeza se aquela bola na cabeça dos astronautas é de fato um escafandro, que é um nome geralmente dado ao instrumento de mergulho inventado por Julio Verne. Abaixo, Armstrong - à esquerda, antes de ir à lua e à direita, depois de voltar.
Em 2 de julho daquele mesmo ano, eu havia sido emocionalmente apresentado ao futebol. Sobre esse dia, ler o premiado (e se não foi, devia) pôsti “Tio Moa e suas reminiscências - Radio Days”
Poucos meses mais tarde, em 19 de novembro, eu estava ansioso; finalmente chegava o dia do jogo que todos aguardavam. Minha mãe, meu avô, meus tios e até as minhas tias, só falavam no milésimo gol do Pelé. Minha santa mãezinha provocou em mim uma expectativa tão grande que me levou a ter a exata consciência de que, naqueles instantes em que Pelé converteu aquele pênalti e o povo invadiu o gramado e o carregou, eu estava presenciando a história.
Hoje, 12 de março de 2011, senti de novo a sensação de estar vivendo a história. Mas desta vez foi diferente. Nas outras vezes foi fácil sentir-me na história; em 69 porque os eventos tinham a atenção nacional e em 85, porque eu estava mergulhado no badernaço. Mas hoje foi preciso um pouco mais. Foi preciso ter ouvido muita música na vida; foi preciso gostar de Balé, das obras dos grandes pintores, de música clássica e talvez de futebol; foi preciso ter uma alma leve (sorte que não foi preciso ter um corpo leve).
Hoje Ganso voltou. O Ganso, Paulo Henrique, aquele craque raríssimo que não foi levado para a Copa por Dunga porque o energúmeno técnico nunca viu um Matisse, nunca ouviu um Bach, nunca viu balé, nunca leu poesia, nunca teve a alma leve. Ganso voltou depois de vários meses parado recuperando-se de uma contusão grave. E ele entrou somente no segundo tempo, depois de um zero a zero complicado no primeiro.
Entrou e em segundos já disse a que veio. Tocou uma vez, recebeu, tocou outra vez. Na terceira vez em que recebeu a bola, tratou-a de meu amor e aos quinze segundos fez um lançamento mágico e deixou o atacante na cara do gol. 1 a 0. Aos nove ele mesmo fez o gol, com um toque que poucos acertariam. Em 10 minutos mudou o jogo e deu show o resto do tempo. A cada toque na bola, uma carícia, um solo de violino, um passo de balé, um sustenido de um tenor. Foi caçado em campo, sofreu faltas violentas, uma das quais gerou a expulsão do agressor, um dunguinha, um escutador de pagodinhos chinfrins e funk brega.
Parece que Ganso nunca esteve parado. Vi nele, hoje, mais, mas muito mais do que um Zidane, com quem o compararam no ano passado. Vi nele o Mestre Dicá, que desenhava obras de arquitetura niemayeriana com a bola. Vi nele um Ademir da Guia, que bailava e tocava violino, como dizia dele o Armando Nogueira. E, sobretudo, hoje eu vi, no Ganso, o próprio e único Ganso, diferente de todos, um gênio inspirador que ao entrar fez com que todos os demais jogadores do Santos jogassem melhor, transformando alquimicamente um joguinho mequetréfi num lindo concerto.
Esse Ganso, se não tiver problemas com contusões (que Deus e os santos, pelo menos os aliados do Seu governo, o protejam), será um jogador inesquecível, um dos melhores da história do futebol. E o dia de hoje será conhecido na história do futebol como “o dia em que o Ganso voltou”. E eu vi!
INFORMAÇOES ADICIONAIS
BADERNAÇO EM BRASÍLIA
No dia 28 de novembro de 1986, ninguém imaginaria que uma manifestação pacífica, convocada pela Central Única dos Trabalhadores (CUT), Central Geral dos Trabalhadores (CGT) e pelos partidos PT, PDT e PCB poderia provocar o maior distúrbio da história de Brasília: o Badernaço. O tumulto começou quando a polícia tentou dispersar os manifestantes que se encontravam na Rodoviária. Várias lojas foram saqueadas (entre elas o extinto posto da Cobal, que em seguida foi queimado), carros da polícia foram queimados ou danificados e 11 prédios públicos, depredados. Oficialmente, após a confusão, a polícia prendeu 34 pessoas.
Apollo 11
Wikipédia - Apollo 11 foi a quinta missão tripulada do Programa Apollo e primeira a pousar na Lua, em 20 de Julho de 1969. Tripulada pelos astronautas Neil Armstrong, Edwin 'Buzz' Aldrin e Michael Collins, a missão cumpriu o objetivo final do Presidente John F. Kennedy, que, num discurso ao povo norte-americano em 1962, estabeleceu o prazo do fim da década para que o programa espacial dos Estados Unidos realizasse este feito. Neil Armstrong, comandante da missão, foi o primeiro ser humano a pisar na superfície lunar. Composta pelo módulo de comando Columbia, o módulo lunar Eagle e o módulo de serviço, a Apollo 11, com seus três tripulantes a bordo, foi lançada de Cabo Canaveral, na Flórida, às 13:32 UTC de 16 de julho, na ponta de um foguete Saturno V, sob o olhar de centenas de milhares de espectadores que enchiam estradas, praias e campos em redor do Centro Espacial Kennedy e de milhões de espectadores pela televisão em todo o mundo, para a histórica missão de oito dias de duração, que culminou com as duas horas de caminhada de Armstrong e Aldrin na Lua.
4 comentários:
Pensei que essa emoção toda fosse pelo Ponte Preta! rs...
bjss
E você viu a minha resposta no face? rs...
Esse Ganso, penso, é um filho bastardo do Falcão, o Paulo Roberto. Assim sendo, um idiota (a sorte do Dunga é que ninguém é perfeito, senão ele seria um PERFEITO IDIOTA) como o Dunga jamais levaria tal artista para a seleção.
quem disse que a Terra é azul foi o Gagarin... (hoje tô chato pra caralho)
Grande Daniel, o Enciclopédico. O Armstrong, como eu citei, apenas constatou que a terra era azul, mas, como era gago, não conseguiu dizer. Gagarin, que apesar do nome não era gago, mas daltônico, realmente foi quem disse que a terra era azul, apesar de ser verde, como todos sabem desde que a cadela Laika visitou a lua, se é que visitou.
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