Orlando Silva |
Houve um tempo em que havia elegância. Não sei se foi o tempo de pardais, de verdes nos quintais, quando ainda havia fadas, mas a contar pelas imagens que o Google nos mostra das meninas aladas, ah, sim, havia elegância.
Também não sei ao certo se o tempo em que havia elegância era aquele mesmo, dos galos, noites e quintais, antes do mal que a força sempre faz, mas creio que sim, a contar pelo que evoca a imagem de um galo cantando, tendo ao fundo, no residual escuro do céu, as estrelas mais resistentes ao iminente nascer do sol, este sim, em toda sua ardida e ferina deselegância.
O fato é que houve um tempo em que havia elegância, disso não há dúvida, a contar pelo fato de que um cantor mirrado e feio, ou, para os policiais dos sentimentos alheios, um cantor desprovido de formosura, fez um estrondoso sucesso tendo como base apenas a voz, não um vozeirão de arrasar quarteirão, mas uma voz sutil e magicamente elegante.
Orlando Silva, o Cantor das Multidões, não tinha essa alcunha por acaso ou por exagero. O cara lotava estádios, levava mais público, em Belém, que o Sírio de Nazaré, levava mais gente às ruas do Rio que uma praia aos 40 graus, cidade maravilha purgatório da beleza e do caos.
Orlando Silva parece ter sido o primeiro fenômeno de massas da música brasileira, e isso tudo sem uma voz potente, como tinham os cantores de sucesso à época, sem corpão sarado, sex appeal ou a cara de bonitão de um Vicente Celestino.
Vicente Celestino |
Ouvir Orlando Silva é fazer essa viagem. Isso é elegância pra mais de metro!
São dois lírios os teus seios alabastrinos
Quase divinos, parecem feitos para os meus beijos...
Caso queira acompanhar a música ouvindo a letra, há dois erros absolutamente bizarros em todos os sites de letras de músicas – não sei de onde tiram exatamente os mesmos erros. No lugar de Muito almejo dos lábios teus o dulçor, colocaram Muito almejo dos lábios teus por um som! Isso mesmo. O cara ouve, não tem vocabulário para entender dulçor, e tasca um por um som. Que falta de elegância! E tem mais: no lugar de Minha alma mendiga amor, curvada aos teus pés, aparece um Minha alma, bendito amor, curvada aos teus pés. Oh céus! Mas ouça, que é de levantar vôo.
Houve um tempo em que os grandes artistas brasileiros eram devidamente homenageados no centenário. Duvido que hoje apareça em destaque o centenário do maior cantor brasileiro de todos os tempos, e cantor dos mais populares, como já desse, mas, com o perdão da deselegância, se o Ximbinha tá ou não comendo a Joelma, ah, isso tá em tudo que é canto dessa internet dos infernos. É deselegância prá mais de quilômetro!
Orlando Silva |
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