Pedi você pra esperar 5 minutos
Porque
você não sabe, você não sabe, você não sabe e nunca vai saber...
(será
que ela não sabe que eu fico acordado pensando nela, todo dia toda hora, apressado,
pensativo, desconfiado, olhando pra todos os lados)
Errare
humanum est
Já
consultei os astros (eles são discretos e silenciosos, são pacientes, assíduos
e perseverantes)
Ela
já se encontra a caminho voando na sua nave maternal feita de um metal
miraculoso
Com
muito amor e flores e música e música
Olha
que rosa lindo, azul turquesa se desfolhando sob os singelos cravos
Tu
terás por esse meio a glória do mundo e toda obscuridade fugirá de ti
Eu
vou torcer pela paz, pelo bem estar, pela compreensão,
Pelo
meu amigo que sofre do coração
Eu
quero ver, eu quero ver, eu quero ver...
Jorge Duílio acordou tarde e abriu a
janela. Queria ver como estava o dia. Gostava de dias ensolarados, mas a manhã estava cinzenta e chuvosa, aquela chuva meio preguiçosa, que não faz muita força para
cair. Jorge Duílio tomou um longo banho para despertar, comeu algo, tomou uma
coca e saiu rumo à Estrada do Itapicuru, 75, no Alto da Boa Vista, Rio de Janeiro. Como por mágica, assim que
saiu se casa, surgiu o sol.
Os deuses astronautas estavam com ele. “É hoje!”, pensou, agora mais alegre. Já
tendo gravado 10 discos, não tinha maiores pretensões a não ser a de se
divertir com uns amigos fazendo algo extremamente prazeroso: gravar as músicas
que havia composto com tanto interesse e cuidado. Não imaginava que, a partir
daquela tarde, no estúdio da Phonogram, gravaria o mais importante álbum
brasileiro de todos os tempos.
Capa original do disco lançado em 1974 |
Lá em cima, abrindo este pôsti, uma
mistura de trechos de todas as músicas do álbum A Tábua de Esmeralda, de Jorge Duílio Lima Meneses, àquela época
Jorge Ben, hoje Benjor. O icônico disco foi concebido sob forte influência daquela
época. O país estava doido pelos enigmas turbinados pelo Fantástico, O Show da Vida, que estreara com enorme sucesso e
repercussão no ano anterior: Eram os Deuses Astronautas, alquimia, a conquista
do espaço, as pirâmides do Egito, exorcismo (insuflado pelo o filme O Exorcista, com reportagens em vários
domingos). Jorge Ben estava doidão pelo espaço, pelos deuses astronautas e,
sobretudo, pelos alquimistas, e o disco mistura tudo isso e mais alguma coisa. Hermes
Trismegisto é o autor do tratado de alquimia que está inteiro na letra de uma
música; Paracelso (que visitava pacientes com uma echarpe multicolorida) é o Homem da Gravata Florida; Nicolas
Flamel, que ilustra a capa, é O Namorado
da Viúva.
Jorge Ben e André Midani |
Todas essas influências não ficaram só na temática do disco – foram
para os arranjos, melodias e forma de cantar. Tudo é alquimia, mágica, experimentação
e psicodelia. Foi difícil que a Phillips o autorizasse a gravar um disco assim.
Queriam o de sempre, o ‘samba esquema novo’, que vendia tão bem. Pra quê inventar?
André Midani, o gerente da gravadora, foi quem bancou. E lá estava Jorge, no
estúdio, pronto para começar a primeira gravação, todos a postos...
Salve!...
Não,
não... Senta... Senta. Não, não, senta. Não, não. Pra sair legal. Senta.
Então,
tem que dançar, dançando. Dançando.
Por que raios foram mantidos, no
início da música que abre o álbum, os esporros que Jorge Ben deu na turma? Provavelmente porque ficou divertido. O disco
é, ao mesmo tempo, leve e denso, alegre e melancólico, pacífico e guerreiro. É
um bate assopra danado, uma montanha russa emocional.
"Pode isso, tio Moa?" Uai, se
ele fez...
É “pedi você pra esperar cinco minutos só, você foi embora sem me atender”
numa música e “põe estrelas em meus
olhos, música em meus ouvidos, põe alegria em meu corpo” noutra.
É ‘há uma princesa à venda, que veio junto com seus súditos acorrentados
em carros de boi’ numa, e ‘essa
gravata é um jardim suspenso dependurado no pescoço de um homem simpático e
feliz’ noutra.
E sai da lisérgica Magnólia, influenciada pela Barbarella Jane Fonda, para cantar com
emoção o reverencial Minha Teimosia, Uma
Arma Pra Te Conquistar, o melhor samba da história do mundo.
E tem o jeito de cantar macio que flutua sobre os arranjos. Canta
quase como roqueiro em Os Alquimistas Estão Chegando, e como um justiceiro ameaçador em Zumbi, uma música tão visual que parece um filme do Tarantino. Não acredita? Dá uma olhada nesse vídeo que inventei de fazer...
Letras ótimas, clima alto astral, arranjos cheios de camadas e surpresas. Enfim, um disco para ouvir milhares de vezes, um disco da série ‘10 coisas para levar à ilha deserta’ e, sobretudo, da série ‘faça um favor a si mesmo’:
Letras ótimas, clima alto astral, arranjos cheios de camadas e surpresas. Enfim, um disco para ouvir milhares de vezes, um disco da série ‘10 coisas para levar à ilha deserta’ e, sobretudo, da série ‘faça um favor a si mesmo’:
Deixe A Tábua...
preparado para tocar (tem no Spotfy, Youtube, etc). Pegue algo bom para beber,
uma soda italiana, um espumante ou sua cerveja favorita.
Envolva seus merecedores ouvidos com um fone de ouvido e peça para não ser interrompido. Deixe num volume bem generoso, que te permita ouvir as várias camadas. Agora solta o play. Boa viagem!
Envolva seus merecedores ouvidos com um fone de ouvido e peça para não ser interrompido. Deixe num volume bem generoso, que te permita ouvir as várias camadas. Agora solta o play. Boa viagem!
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