sábado, 28 de julho de 2012

A ABERTURA DAS OLIMPÍADAS DE LONDRES E O SACI-PERERÊ


Bem, amigos do Cobra Parada, as olimpíadas estão começando... HAJA CORAÇÃO!!!
Haja coração para acompanhar os atletas brasileiros que, como nós, sofrem do complexo de vira-latas, como disse o sapientíssimo Nelson Rodrigues. Sim, nascemos perdedores, sabemos disso, e não me venha o Shiniashik ou quetais dizer que somos vencedores porque entre milhões de neurônios etc etc etc. Essa consciência da nossa sina perdedora tempera nossa vida com bacias de angústia.
Só fomos (passado) os reis do futebol porque o futebol era o único esporte para um país com muito espaço e com muita gente pobre, sem ter o que fazer, sem educação, sem trabalho e sem cultura; adubos perfeitos para o futebol. Acabou, voltamos à sina perdedora. Podemos arrumar desculpas para as derrotas, mas o fato é que perdemos porque não somos mais os melhores, longe disso. E o vôlei? Bem, o vôlei andou ganhando, tudo bem, mas mesmo no vôlei somos perdedores. Perdedores que adoram ganhar só por picardia!
Na hora de decidir, temos que ser vinte vezes melhor que o adversário, temos que massacrá-lo, porque senão, se a decisão está ali, equilibrada, o que acontece é que amarelamos. Até nosso cavalo amarela! Lembra do cavalo Baloubet, favoritíssimo, que em Sydnei refugou TRES vezes?  
Pois o fato é que sofreremos nas próximas duas semanas na frente da televisão. Mas já começamos a sofrer hoje, logo na abertura de uma Olimpíada. Sofrer na cerimônia de abertura? Sim, eu vi a abertura pelo Sportv e me senti o mais pleno e vagabundo cachorro vira-latas tomado de sarna, com fome e com sede.
Ora, direis, a abertura não foi assim ruim, e eu vos direi, no entanto: a abertura das olimpíadas me deixou pálido de espanto, tão sensacional que foi. Apesar de achar que essas aberturas são todas de uma chatice monumental e breguice faraônica, estava curioso pelo fato de um cineasta (Danny Boyle, “147 horas”, “Quem que ser um milionário”) tê-la dirigido. Pois fui tomado de assalto por um gigantesco espetáculo que encenou transformação do país (e do mundo) desde a era agrícola até os dias das redes sociais. Tudo por meio das mais características manifestações artísticas inglesas. Lá estava o cinema que inventou James Bond e os saltos de aviões. Lá estava o tradicional humor inglês. Lá estava a vida urbana e baladeira de Londres e lá estava, sobretudo, a música.  Momentos mais marcantes:
O campo, com cavalos, vacas, gansos e galinhas e fazendeiros e sua transformação nas fábricas da revolução industrial, com as gigantescas chaminés brotando do solo, a encenação perfeita, centenas de atores, a exploração dos trabalhadores e a forja dos anéis olímpicos;
A cena com o Rowan Atkiinson, o Mister Bean, como instrumentista da orquestra que tocava o tema de “Carruagens de Fogo”. A cena, genial e engraçada, brinca com a música e com o filme, ao mesmo tempo ironizando-os e homenageando-os.
A cena, filmada, do James Bond (Daniel Craig) recebendo a missão da Rainha Elizabeth em pessoa (acho). A Missão é levá-la ao estádio para a abertura das olimpíadas. Embarcam num avião. Quando o avião sobrevoa o estádio, no filme e ao vivo, eles saltam. Engraçadíssimo ver a rainha, velhinha, se jogando do helicóptero para, em seguida surgir, com a mesma roupa, entrando no camarote real.
A cena no hospital infantil, com Mike Oldfield tocando ao vivo Tubullar Bells, os vilões (Voldemort, Gancho) e as dezenas de Mary Poppins chegando dos céus nos seus guarda-chuvas.
A viagem ao tempo através da música, com projeções de bandas, danças e coreografias. Um espetáculo praticamente o de um desfile de escola de samba do Rio, só que muito mais amplo, complexo e, com mil desculpas, muito melhor.
O apoteótico final da cerimônia, com o acendimento da pira olímpica mais criativa e gigantesca da história, que culminou com uma imagem aérea do estádio e de todo o complexo olímpico com o majestoso espoucar de fogos de artifício, tudo ao som glorioso de Eclipse, música que finaliza The Dark Side of The Moon, do Pink Flyd, o melhor álbum de música pop de todos os tempos.
A concepção geral, que privilegiou os bilhões de expectadores do mundo ao integrar todo o espetáculo com a TV. Bom, não queria ser óbvio, mas teve o chatinho do Paul com a sempre maravilhosa Hey Jude e seu indefectível transe delirante coletivo náaaa, náaa, náa, ná, ná, ná, na.
Bom, voltando ao despertar do cão vira lata que mora dentro de mim ao ver a transmissão pelo SPORTV: já que não foi pela qualidade do espetáculo, então porque foi? Sim, o motivo foi ele, o dito cujo, o carcará, o sujeitinho: Galvão Bueno. Não sou do tipo que não gosta, mas não muda de canal. Também não sou dos que aderem a movimentos e campanhas, como a que pede “Cala a boca, Galvão”. O problema é que hoje o som da ESPN estava muito ruim, e a música era o personagem principal do espetáculo.
Além disso, os narradores de hoje no Sportv eram Milton Leite, disparado o melhor narrador da atualidade, e o Luiz Carlos Junior. O primeiro, além da voz agradabilíssima, é espirituoso e sempre capaz de tirar da manga um improviso, uma grande sacada, um comentário inspirado. Luiz Carlos Junior fez uma ótima tradução simultânea e recheou sua narração com comentários concisos e informações que revelaram, além da leitura do guia distribuído, uma boa cultura geral. Enfim, os dois conduziram com maestria a transmissão, embora pudessem falar um pouco menos na próxima vez. Deveriam ser os narradores oficiais do carnaval, no lugar dos intragáveis Kleber Machado e Luiz Roberto.
Entretanto, no caminho do prazer havia uma pedra. Galvão Bueno hoje foi comentarista, veja você. Sua voz entrava sobre a dos narradores (ele estava num estúdio). Suas observações tinham o tom de demiurgo, de arauto oficial do deus brasileiro, um deus criado por ele mesmo, Galvão, para gerir o país em seu lugar, já que ele viaja muito. Seus comentários de hoje não foram apenas chatos, óbvios ou equivocados. Ele não apenas leu prospectos explicativos como se fosse sua própria opinião, como se sempre tivesse frequentado a casa do Keneth Branagh. Hoje ele fez mais: encarregou-se de ser o garoto propaganda das olimpíadas no Brasil. Não falou de outra coisa. Estava atento a qualquer erro no evento, como se estivesse narrando um Brasil x Argentina (louco para algum argentino fazer uma falta um pouco mais forte para que ele possa dizer que argentinos são catimbeiros e só sabem brigar, como se não soubessem jogar futebol).
Odiou a rainha pulando do helicóptero com James Bond. Disse que tem certeza que no Brasil nós não vamos jogar rainha nenhuma do helicóptero! Ah, também disse que o ator deveria ser o Sean Connery, que escalar o atual James Bond, Daniel Craig, foi uma pisada na bola do diretor, e que além de tudo, o Sean Connery atual, com seus 80 manos, combinaria mais com a Rainha. Leitor, para já de rir, não é piada, nem mentira, ele disse isso mesmo. Disse ainda que no evento faltou calor humano, e que essa é a marca do Brasil, ou seja, aqui a abertura será muito melhor. Eles têm música? E a música brasileira, então? Temos muito mais!!! Asqueroso.
Pessoa boa que sou, ofereço uma interpretação positiva sobre o atual estado de Galvão Bueno: depois de décadas como o porta voz esportivo da oficialidade, como proprietário único da opinião de todo o povo brasileiro e como defensor intransigente de seja lá quem, ou o que, esteja no poder, a mente de Galvão Bueno se obnubilou, e hoje ele não tem mais a menor noção de realidade. Só o que vê na frente é inexorável caminho para a vitória e para a glória de um povo que só existe na cabeça dele, um povo lunático que não come, não estuda, não vê filme, não faz sexo, não tem aspirações profissionais, não cria filhos, não tem dívidas, não trabalha, enfim, um povo que não vive, um povo que só tem um desejo: demonstrar que é superior a todos os outros povos, um povo que merece muito mais do que qualquer outro povo, porque é um povo mais alegre, mais criativo, mais cheio de ginga, mais moleque, um povo que tem muito mais coração do que qualquer outro. Se for este o caso, basta uma internação.
Mas como tenho um lado mau,embora talvez mais realista, ofereço uma interpretação alternativa sobre o atual estado do Galvão: ao diminuir os momentos fantásticos de realização artística do evento em Londres, decretando que no Brasil “com toda certeza” faremos muito melhor,  ele despertou, ao menos em mim, o  complexo de vira-latas (sei que vamos perder). No lugar de me deixar mais ufanista, me deixou mais temerário pelo mico que podemos fazer, ou, o que é ainda pior, imaginando o quanto, para fazer um evento maravilhoso, e de última hora, é claro, nossos políticos e empresários poderão se enriquecer as nossas custas. Pensei no tanto que o país desviará da educação, pesquisa e desenvolvimento. Lembrei-me que a gigantesca Vila Olímpica de Londres custou menos que o orçado, enquanto que o Pan realizado no Brasil saiu 10 vezes o valor previsto.
Assim que terminou a cerimônia (de uma olimpíada que, por sinal, ainda vai começar), ele disse algo como: esta cerimônia foi boa? Sim, foi boa, mas é passado. Agora o único assunto que importa é a abertura das olimpíadas no Brasil. Ou Galvão está completamente insano ou ele é realmente muito, mas muito imbecil. Bem, há ainda a hipótese de ele ser um objeto útil, é claro.
Será que na “vida real” ele também é assim? Ou é só um personagem? Seja como for, seja apenas um personagem, ele não apenas é chato ou insuportável. Ele é pior: ao pintar o país em cor de rosa (ou em verde e amarelo), Galvão Bueno faz muito mal, não só para o esporte, mas para o próprio povo brasileiro, que ele tenta manipular, para deleite de quem disso se beneficia.
Para finalizar, um momento de diversão: como já citei, para tudo o que havia no evento, ele dava uma ideia de o que poderemos fazer aqui. Comparou o que mostraram lá com o que temos aqui em termos de literatura e folclore. Eles têm Harry Potter? Pois nós temos o Saci Pererê! (desculpe, mas tenho que soltar um kkkkkkkk). Com todo respeito, tenho a impressão de que o nosso simpático saci não seja tão conhecido mundialmente quanto o Harry Potter. A não ser que até as olimpíadas do Rio, o Galvão percorra o mundo disseminando as aventuras do Saci. Verba pública não vai faltar.

segunda-feira, 23 de julho de 2012

AS TRUFAS BRANCAS E AS MORTES DO BEM AMADO


PREÂMBULO
1 - AS PÉROLAS E OS PORCOS
Falemos de comida: eu, tu e o rabo do tatu sabemos que mesmo que você tenha os melhores ingredientes, temperos finos, forno e fogão de primeira, ainda assim você pode fazer uma comida horrorosa. É ou não é, ou não é, ou não é? “Ééééééé”, você deve estar quase gritando, pois se lembrou de algumas gororobas nojentas que já fez. Esperta é uma amiga, a Fernanda (desculpa, mas é melhor que todos saibam), tão consciente de suas limitações na cozinha, que há 3 anos não tem mais fogão em casa. Diz ela que desistiu depois que não acertou fazer um chá de saquinho (a cordinha entalou na garganta).


Agora veja esta: num filme legal chamado “Gente Grande”, com o chatinho do Adam Sandler, há uma cena em que algumas esposas, longe dos olhos dos maridos, estão nas cadeiras de uma piscina, vendo os homens de sunga (que merda, elas também fazem isso!), quando sai da água um deus nórdico, loiro, tórax bem definido, olhos verdes, azuis ou uma dessas cores que fazem as mulheres delirarem, enfim, um baita homem, que ao vê-las babando por ele, abre um sorriso lindo e começa a andar na direção delas, que ficam ouriçadas (ou seja, molhadas sem entrar na piscina) para saber quem vai pegar o cara (elas sabem que são elas que escolhem, e não nós, homens). Quando o cara chega... Bom, primeiro veja esse trailer curtinho (o pedaço da cena está quase no final), depois a gente continua a conversa.

Um terceiro exemplo: imagina o Barrichello, ou mesmo o Massa, pilotando numa Ferrari. Bem, nem precisa imaginar; hoje mesmo, domingo, 22 de julho de 2012, tivemos mais um exemplo. Com a mesma Ferrari, Alonso está em primeiro no campeonato, com 154 pontos; Massa em 14º, com 23 pontos...

ÂMBULO (AQUILO QUE, AO MENOS DEVERIA SER ASSIM CHAMADO, VEM DEPOIS DO PREÂMBULO)
Paulo Gracindo e Lima Duarte em "O Bem Amado"
2 – FERRARIS E TRUFAS BRANCAS
Pronto: agora vamos andar (ou deambular) com esse pôsti cheio de preâmbulo, já que o leitor mais ansioso deve estar se perguntando “o que é que o cú tem a ver com as calças?” Explico: o canal Max* (não procure nota explicativa no final do pôsti – essa estrelinha aí é mesmo do nome do canal) está exibindo: “O Bem Amado”, baseado na peça homônima do genial Dias Gomes, que também virou novela, talvez a melhor novela de todos os tempos, que unia os gênios Dias Gomes, Paulo Gracindo e Lima Duarte. Odorico Paraguaçu, interpretado, na novela, por Paulo Gracindo, é um dos personagens mais conhecidos e engraçados da nossa cultura popular. Dispenso-me de falar do texto, absolutamente genial - ops, acabei de falar. 


O filme, de 2010, é uma produção brasileira que conta com o time e com o padrão Globo, que um dia significou qualidade, ousadia e criatividade, mas que hoje desafia a qualidade, esmaga a criatividade e foge como o diabo foge da cruz da ousadia. Ih, lá vem os chatinhos defendendo a Globo, dizendo o que eu, tu e o rabo do tatu já sabemos: que lá estão os melhores profissionais, os melhores cenários, o melhor som, os melhores equipamentos, os melhores recursos, enfim; que as novelas globais são como um chocolate que derrete deliciosamente na boca ao final de um dia estressante e etc, etc, etc.

Aqui é o momento de retornar aos exemplos do preâmbulo: tudo isso são as pérolas. A produção da Globo e alguns excelentes atores nas mãos do Guel Arraes (o diretor) ficaram como a Ferrari nas mãos do Barrichello, o deus nórdico naquela voz ridícula, e como trufas brancas, foie gras e açafrão indiano da caxemira nas mãos da Fernanda.

Um pouco, só um pouquinho, de talento e inteligência artística seria suficiente para perceber que o que tinham de principal nas mãos era:
- uma trama ótima e atemporal - o prefeito corrupto e encantador que quer inaugurar o cemitério tentando arrumar, na marra, um morto;
- um texto brilhante, com as inesquecíveis falas recheadas das deliciosas palavras inventadas, embora perfeitamente inteligíveis;
- dois personagens ricos, cheios de contradições e idiossincrasias, que inspiravam amor e ódio. 


3 – RUBENS E FERNANDAS
Pois essas três características, que são exatamente o que há de melhor e de inigualável na história, foram preteridas, jogadas no lixo em nome da hiperatividade, marca da direção histriônica de Guel Arraes. Sabe quando você põe sal no bacalhau? Não há uma única fala que o diretor não queira “temperar” com um movimento exagerado de câmera, com algum exemplo dado pelas mãos dos atores, com cenas sobrepostas que ilustram falas de Odorico, deixando-as em off, como se duvidasse da inteligência do expectador e tivesse que explicar. 


Tudo isso cansa demais e, longe, muito longe de facilitar o entendimento, tira a atenção da fala, ou seja, afasta o expectador exatamente do que há de mais belo no filme, que é o texto. Além disso, o Odorico interpretado pelo Marcos Nanini é sempre afetadíssimo, sempre falando muito, muito rápido e como se tivesse uma batata na boca, deixando as falas quase incompreensíveis e a cena muito irritante. Tudo é visual e auditivamente cansativo. Não sei qual a culpa de Nanini, um fantástico ator, nessa interpretação muito ao estilo frenético do Guel Arraes, mas o fato é que ele, Nanini, derrapa feio, muito feio; perdeu a oportunidade de criar um belo personagem. Nem precisava imitar o Paulo Gracindo, o que certamente seria um erro. Bastava criar um personagem que usasse o magnífico texto ao seu favor, dizê-lo de modo que pudéssemos ouvir, no lugar de vomitar as falas como faz.


Maria Flor no filme
Achou que ia acabar o pôsti sem uma mulher bonita?
E o Zé Wilker? Bem, este, sabidamente, não está no nível do Nanini, mas ainda assim poderia ter feito algo melhor do que começar e terminar o filme naquela interpretação monocórdica, pesada e cansativa de Zeca Diabo, que no texto é interessante e engraçado. Até a maravilha da Maria Flor, linda e talentosa, e as irmãs Cajazeiras, feitas pelas boas comediantes Zezé Polessa, Andréa Beltrão e Drica Moraes, todas elas são puro trejeito e ondulações de voz, cansativas e sem nenhuma graça. Que desperdício!


4 - EPÍLOGO – AS MORTES DE ODORICO PARAGUAÇU E D”O BEM AMADO”
No final da história de Dias Gomes, Zeca Diabo, o pistoleiro contratado por Odorico para matar alguém a fim de inaugurar o cemitério, mata o próprio contratante, que, ironia das ironias, este sim, com sua própria “defuntice”, inaugura o cemitério construído com superfaturamento. 


No filme, quem mata o “Bem Amado” são Guel Arraes e o atual padrão Globo, que menosprezam as pessoas que pretendem atingir, julgando-as incapazes de entender um texto tão popular quanto o de Dias Gomes, e achando que elas são capazes apenas de captar a linguagem de games e vídeo clipes. Pois erraram, e a bilheteria confirmou isso. Por acaso você foi ao cinema ver “O Bem Amado”? Eu fui.

sábado, 21 de julho de 2012

VIAGENS FASCINANTES COM LYKKE LI

Quer dar um passeio pela cena noturna de New York?


Quer viajar ao tempo em que Kate Bush estava a mil na sua fase pós-romântica?


Que tal estar no backstage de um desfile de modas na Europa?


Sabe aquele clima dos filmes do David Lynch com aquelas músicas etéreas do Angelo Badalamenti? 


Está com saudades daquela sonoridade romântico-retrô da Amy Winehouse? 


Gosta do som de violão suavemente folk, com tons de Neil Young?


E uma viagem ainda maior no tempo? Que tal os anos 50, aqueles da rede de lanches The Fifties, ouvindo aqueles grupos vocais femininos cantando Mister Sandman (toca quando McFly chega aos anos 50 em “De Volta Para o Futuro”) ou Be My Baby (que rola nos créditos de “Baby Mama”)?


Gosta de melodias boas de cantar? E de um bom refrão, daqueles gostosos de repetir? 


Você é do tipo que gosta de se sentir inteligente e moderno?

Gosta de letras poeticamente fortes e angustiadas?


E que tal agora fechar os olhos e enxergar na sua frente uma mulher linda, toda vestida de preto, cantando prá você com uma sensualidade gélida e uma voz deliciosa e levemente nasalada, cantada por lábios docemente carnudos? 


Lykke Li
Ter tudo isso não tem preço. Tanto não tem que é quase de graça: pela merreca que custa um CD você pode ter tudo isso. Saia daí agora e vá atrás de “Wounded Rhymes”, CD da Lykke Li. Ouça e você viajar por todas essas sensações e muitas mais (pode ser a seco, inclusive, embora um tempero sempre seja bom – o meu preferido é uma taça borbulhante). Cada faixa é uma viagem diferente, todas fascinantes. 


A Lykke Li, sueca, segundo disco, conseguiu tirar meus ouvidos do monopólio do Príncipe do Sertão a que, nas últimas semanas, se sujeitavam. Isso não foi pouco. E haja mudança de rumo. Talvez as elegantes cantigas sertanejas tenham aberto minha alma para receber o som dessa menina de vinte e poucos anos. Não é pouca coisa o que essa mulher faz.  


O mundo precisava mesmo de mais uma cantora assim, que pudesse derramar sobre os mais exigentes suas músicas cheias de beleza, densidade e diferentes texturas. Uau!


domingo, 15 de julho de 2012

A DELÍCIA DA VIDA, A DELÍCIA DA VIDA

Ah, essa vida!!! Assim, cheia de exclamação!!!!!! Como é bela a vida. Vou até mandar um daqueles sorrisinhos :)


Sabe o que é? É que descobri que a vida é cheia de altos e baixos. E que não importa onde você esteja, por que tipo de situação que você esteja passando, a verdade é que a felicidade é uma opção que você faz. A vida é uma luta constante. Não é sempre que a gente está por cima, mas temos que valorizar cada instante, porque cada instante é nosso, só nosso. Cada momento da sua vida é único e é só seu. Se hoje você está na pior, está por baixo, use o fundo do poço como base para subir. Quando você está por cima, o que mais vale não é onde você está, mas o esforço que você fez para chegar lá.


Caro leitor contumaz do Cobra Parada, pronto: você está livre para ir ao banheiro. Vá correndo que sei que você deve estar com vontade de vomitar. Enquanto você vomita eu vou me dirigir aos visitantes. Vá tranquilo.


Você, caro visitante, que não sabe bem o que costuma rolar por este insconstante blógui, tem dois caminhos: caso você tenha achado muito legal tudo o que escrevi no começo e tenha se iluminado e pensado “nossa, que legal, é exatamente o que eu penso”, eu o aconselho ferozmente a clicar naquele xis que fica lá em cima e sair deste horrendo e detestável blógui cujo autor não sabe nem escrever blógui direito.
Mas caso você, novato visitante do Cobra Parada, seja uma daquelas pessoas que não engole sapo, e que, ao ler o início pensou “vixi, que coisa chata esse monte de frase feita”,  tente seguir adiante, porque, no mínimo, nós concordamos em alguma coisa.

Pronto, voltaram os seguidores que vomitavam e o Cobra volta a estar em rede nacional.


Voltando ao fundo do poço... sabe o que é o fundo do poço? É o lugar mais nojento que existe. Cheio de baratas, ratos, limbo e escuridão. Quer coisa mais chata que o escuro? No fundo do poço dificilmente você vai comer alguém. Mulher nenhuma quer fazer esse tipo de coisa com quem está no fundo do poço. Aliás, no fundo do poço as posições seriam dificílimas. No fundo do poço não tem um champanhe gelado, nem taças de cristal. Enfim, o fundo do poço é simplesmente o fundo do poço.


A vida ter altos e baixos é a coisa mais injusta que pode existir, porque sempre haverá gente que só fica lá em cima e gente que só fica lá em baixo. Os raros que conseguem subir por esforço próprio, comem o pão que o diabo amassou durante a subida, que muitas vezes dura a vida toda, e a vida pode se acabar ainda na subida.


Subir é péssimo. Bom é estar lá no alto. Quando escalamos uma longa subida, suamos horrores, o peito parece que vai explodir, falta o ar, as pernas doem, fraquejam, parece que a gente nunca vai chegar, a gente fica todo vermelho, enfim, é um inferno, e eu morro de medo do inferno. Por isso acredito em deus, ops, Deus. Vai que Ele existe mesmo e resolve me mandar pro inferno se eu não acreditar nele. Meu medo do inferno é tanto que, por via das dúvidas, optei por fazer sempre o bem. Ou a tentar, é claro, porque o que vale é a intenção.


Tá, tudo bem, tenho minhas dúvidas quanto à sua, digo, Sua existência... Morro de medo do inferno. Eu posso não acreditar muito no céu, mas o inferno, a julgar pelo que vimos na terra, talvez exista mesmo. Entre o céu e o inferno, convenhamos, as chances de existir o inferno é muito mais real, afinal, há muitos indícios por aí. Já o céu, como descrito por quem o descreve, não se costuma ver por aqui, não. Se bem que eu não ia gostar muito do céu se ele fosse mesmo todo cheio de gente vestida com roupinhas claras esvoaçantes, com cabelos de propaganda de shampoo e aquele sorrisinho tatuado na cara, um lugar todo clarinho, cheio de luz. Não ia dar certo comigo: tenho dor de cabeça e fotofobia. Prá mim bastaria ao céu que tivesse ar condicionado, DVD, coca-cola na geladeira e mulheres agradáveis, e que eu pudesse praticar agradabilidades com elas, evidentemente.


É por isso tudo que sempre desconfio de pessoas que vem de baixo, que subiram com esforço próprio. Gente que suou muito não pode cheirar muito bem. Prefiro as que nasceram em berço de ouro: são mais autênticas e tem pele melhor. Gente que vem de baixo é muito competitiva, é gente que faz, gente vencedora. Tenho problemas com esse tipo de gente. Prefiro as que não precisam de vitória.
Você gosta de subir escadas ou prefere um elevador? 


Não pense, leitor estupefato, que falo que é melhor estar no topo porque eu ame o topo. Nada disso. O que preciso para estar bem, ou feliz, como todos os rostos do facebook, é muito pouca coisa. E tudo o que preciso se pode encontrar também no plano. Não o Plano Piloto, Brasilia, embora ali também. Plano no sentido relevante (de relevo): lugar de onde não se precise descer nem subir. Um lugar em que se valorize o ócio. Um lugar de onde se possa desprezar qualquer subida ou descida. 


Bem, minha filosofia do dia se deve a um passeio que hoje fiz, reinaugurando minha bicicleta, que voltou para casa depois de prolongadas férias de mais de dois anos. Desci pelo magnífico Parque de Águas Claras. Foi maravilhoso. Os caminhos são lindos, cheios de mato. No bom sentido: mato que não invade o espaço de quem anda, que fica ao largo dos caminhos devidamente limpos e asfaltados, nem muito largos, nem muito estreitos. O mato não te incomoda. Parece que até os infernais mosquitos e demais insetos típicos da natureza ficam ao largo dos caminhos, como se fosse proibido invadir a pista por onde desfilam pessoas que prezam a saúde, algumas das quais bastante interessantes de se ver, especialmente com as roupas que usam para praticar o estranho ritual que as mantêm bastante interessantes de se ver.


Foi maravilhoso descer de bike (sou moderno) aquele parque realmente muito bonito e aprazível. O cheiro da vegetação, o ar fresco a lamber o rosto, a sensação de liberdade, tudo isso não tem preço. Mas se uma coisa eu aprendi com a vida, e especialmente com o dia de hoje, é que, quando a gente desce e não tem um carro te esperando lá embaixo, a gente vai ter que subir. Maldição! A fugaz facilidade da descida não justifica o infinito calvário da subida. E olha que a bike é boa, tem milhões de marchas que, dizem, “facilitam” a subida. Facilitam... Tá bom. Tentei de tudo o que orientam os vencedores (argh!), os que adoram desafios (blargh!). Tentei mirar a próxima subida e falar assim: “você pensa que vai me vencer?” Dizem que isso dá força prá subir. Só que, juro, quando eu terminei a frase a subida respondeu: “É claro que vou te vencer, você vai enfartar nos meus braços, seu fraco”. Naquele instante, parecia que uma máquina gigante de fazer vácuo para conservar alimentos (minha irmã tem uma dessas porque meu cunhado adora comprar coisas tipo Polishop) tirava o ar de todo o parque.


Tentei me concentrar na música que estava ouvindo (Lykke Li, deliciosa). Tentei imaginar que a lindíssima vocalista cantava só prá mim, toda lânguida. Nada. Tentei pensar: “não tenho pressa, vou devagarinho”. Tentei optar por ser feliz. Pungente bobagem. Tudo inútil. Cada vez mais cansado, quanto mais eu pedalava, mais aumentava a distância a percorrer para eu chegar em casa. Uma velhinha toda curvadinha que andava apoiada em sua filha, que também já era bem passada, tentou me animar, o que, evidentemente, me destruiu ainda mais. Tentei tudo o que é aconselhável para conseguir vencer a distância e as subidas, mas estava cada vez mais longe de casa e cada vez mais perto de um cara que estava me seguindo. Ele usava uma roupa preta estranha com um capuz que lhe cobria o rosto. Ele também empunhava uma foice. Podia ser pior, por exemplo, podia ser o Brad Pitt em Encontro Marcado ou o careca gozador que gosta de jogar xadrez em “O Sétimo Selo”.    


Bem, você deve estar pensando que, se estou escrevendo este pôsti, então é porque nada de errado aconteceu. Você é capaz até de julgar que estou exagerando. Sim cheguei, é bem verdade. Sim, eu me esforcei muito, suei demais, mas cheguei onde eu queria. É isso que você queria ler? Tá bom, escrevi. Agora vem até aqui, na minha casa, pra sentir meu cheiro (você acha que consigo ficar em pé ou mesmo caminhar até o chuveiro?), pra ouvir meus gemidos de dor na musculatura dos quatro membros de que disponho. E não imagine que, depois de tudo isso, eu disponha de um quinto membro. Sem chance, pelos próximos meses, ou anos, estou absolutamente incapacitado de fazer qualquer tipo de esforço físico. Nem os agradáveis. Alessandra Negrini, nem sonhe em me ligar, "não é com você o problema, é comigo!"


Isso me lembrou do trecho final de In Extremis, poesia de Olavo Bilac, um de meus ídolos da juventude:


E eu morrendo! E eu morrendo,
E vendo-te, e vendo o sol, e vendo o céu, e vendo
Tão bela palpitar nos teus olhos, querida,
A delícia da vida! A delícia da vida!

sábado, 14 de julho de 2012

WOODY ALLEN POR COUTINHO


Preguiça e dores de cabeça se juntaram e resolveram ratificar a mensagem do pôsti anterior sobre Woody Allen e seu último filme, "Para Roma, com Amor", reproduzindo as interessantíssimas observações de João Pereira Coutinho sobre o filme e seu autor, publicadas na última terça-feira em sua coluna no caderno "Ilustrada", da Folha de São Paulo (Folha, não dá prá não assinar!). Lá vai. 


WOODY Allen tem 47 filmes no currículo. E quando lhe perguntam se existe um único que ele compare aos melhores de Ingmar Bergman, Woody é modesto: nem um.


A frase sempre me pareceu excessiva: "Crimes e Pecados" (1990) está ao nível de "Morangos Silvestres" (1957). E "Zelig" (1983) não tem paralelo como comédia nos últimos 30 anos. O problema de Woody não é falta de obra-prima. É falta de obra-prima recorrente. Depois de "Crimes e Pecados", há coisas boas aqui e ali. E algumas joias antigas, como "Manhattan" (1979) ou "Hannah e Suas Irmãs" (1986).


Mas Bergman, admito, era capaz de fazer cinco filmes seguidos que mudavam a cultura de uma época. Quem começa com "Mônica e o Desejo" (1952) e termina o festim com os referidos "Morangos" sabe que não minto.


Por isso assisti a "Para Roma com Amor" sem expectativas homéricas. Os cínicos dirão que Woody Allen deixou de dirigir filmes. É hoje guia turístico que vai para onde lhe pagam: Londres, Barcelona, Paris. Quem sabe o Rio.


O próprio alimenta o mito: tempos atrás, de passagem por Portugal, perguntaram-lhe quando filmaria ele em Lisboa. Woody foi honesto: "E você consegue o dinheiro?"


Certo. Sem dinheiro, não há obra. Mas "Para Roma" não é mera encomenda italiana. É, como sempre acontece, um pretexto para revisitar os temas que são caros ao "autor" (e uso a palavra com o seu significado clássico).


O próprio Woody, aliás, assume essa condição metacrítica no filme. Por exemplo, quando os personagens contemplam as ruínas romanas e confessam sofrer de "Melancolia de Ozymandias".


Trata-se de uma referência erudita ao poema de Percy Shelley (1792-1822) sobre a estátua de Ozymandias, "rei dos reis", e testemunho material da inutilidade da existência quando a morte é certa.


Shelley escrevey "Ozymandias" em 1818, mas o poema deixou de lhe pertencer em 1980 quando foi apropriado por Woody "himself", em seu incompreendido "Stardust Memories - Memórias" (1980). É a primeira vez que um personagem seu é diagnosticado com a doença.


O cinema de Woody Allen é feito de evocações eruditas que se repetem de filme para filme. A tribo é a mesma: Shelley, Yeats, Rilke, sobretudo as linhas finais de "O Torso Arcaico de Apolo", presente neste filme pela boca pedante da personagem de Ellen Page (e presente em "A Outra", com força dramática decisiva).


Mas não são apenas as evocações eruditas que se repetem. Todo o resto retorna, a começar pelo amor romântico, pelos equívocos do amor romântico, pela tensão constante entre a razão e a emoção -a perpétua batalha em que a última vence temporariamente o confronto.


São incontáveis os filmes de Woody Allen em que os personagens (masculinos) se jogam pela janela amorosa, mesmo que o salto seja efêmero e suicidário. O ator Jesse Eisenberg representa em "Para Roma" o mártir sentimental da história. Eisenberg nasceu em 1983.


Mas, antes de ele nascer, muitos outros já tinham pulado pela mesma janela. A começar pelo próprio Woody Allen, como Alvy (em "Annie Hall") ou Isaac (em "Manhattan").


Não temos cura. E, para um longo cliente da psicanálise, nem o divã nos salva: haverá paciente que tenha dedicado à terapia tantas linhas de irrisão? "Se você encontrar Freud, peça-lhe o meu dinheiro de volta", diz ele à mulher psiquiatra (Judy Davis).


Finalmente, o melhor do filme: a história do cantor de ópera que só funciona no chuveiro. E que é levado para os palcos italianos com o chuveiro atrás.


É preciso ter passado décadas nas páginas da "New Yorker", a casa de S.J. Perelman ou Robert Benchley, para escrever uma gag dessas. Uma gag comparável ao casal que só conseguia transar em espaços públicos (em "Tudo o que Você queria Saber sobre Sexo"). Ou ao ator que estava fora do foco na vida real (em "Desconstruindo Harry").


Sim, são 47 filmes. Um ou dois não fazem má figura quando Bergman está por perto. Mas a obra-prima de Woody Allen não se resume a um filme ou dois. Na verdade, ela ainda está a ser retocada, ao ritmo de um filme por ano.


Um dia, quando olharmos para o conjunto, veremos que a repetição também é uma arte. E que os gênios são, como dizia Nelson Rodrigues, flores de obsessão.



domingo, 8 de julho de 2012

PARA ROMA E NEGRINI, COM AMOR


Eis um dilema universal: 


“E aí, caso com uma mulher tipo A (linda, gostosa e sensual) ou com uma mulher tipo B (inteligente, de bom papo e feita para ser uma boa esposa)?” 


É claro que existem as bonitas e inteligentes, que podemos chamar de tipo C (sendo C=A+B), mas além de serem poucas, elas já estão comprometidas com os Brad Pits, Djokovics e João Wainers da vida (João Wainer, a quem eu desejo a morte - no sentido de transformação, é claro, está trocando fluidos com a Alessandra Negrini, o que me enche de inveja e ódio). Ou seja, eu não tenho chances com essas, do tipo C: não sou famoso (este blógui é, mas o autor não). Também não posso ser chamado de bonito; nem minha mãe dizia que eu era bonito!


Jelena Ristic (namorada de Novak Djokovic)
Deus, se é que ele, ops, Ele, existe e se é que, em existindo, Ele seja responsável por este tipo de coisa, não me proveu com os lindos olhos verdes do Brad Pitt, nem com os azuis do Fábio Assunção, nem com a fama e o tênis do Djokovic, que o faz ter essa namorada aí ao lado. Considero injusto esse descaso divino. A injustiça divina também se manifesta em meu rosto, absolutamente comum; e o comunismo, não o sistema político, mas o fato de ser comum, é, como bem sabem os seguidores deste blógui, um tremendo insulto para mim. Não tenho nem ao menos um corpo como o do Anderson Silva. Bom, pelo menos o criador não me castigou com uma voz horrorosa (tá vendo como Deus castiga quem é de briga? – veja se Gandhi ou a irmã Dulce tinham a voz horrorosa como a do lutador ou a de Hitler... quer saber se uma pessoa é má: ouça sua voz).


Bom, o fato é que, apesar de ser da paz, não sou lindo, nem ao menos bonitinho, nem bem dotado (refiro-me ao aspecto geral dos meus dotes físicos, não ao tamanho do meu membro, assunto do qual prefiro fugir, para não me depreciar ainda mais). Quer mais? Como já disse, não tenho elegância nenhuma. Entretanto, engana-se quem pensa que, por causa disso, não pego ninguém. Minha sorte é que o dilema acima não é exclusividade masculina e que as mulheres, ocasionalmente, optam por homens do tipo B, mulheres que se interessam pela inteligência, e algumas delas realmente acreditam que eu tenho alguma.

"Eu te amo, mas não quero filhos com nariz de batata"
No filme “O Primeiro Mentiroso”, a mocinha bonita gosta muito do Rick Gervais (tipo B), mas como no filme ninguém (exceto o protagonista) sabe mentir, ela responde negativamente ao pedido de casamento: “apesar de gostar muito de você, não quero que meus filhos sejam gordinhos e tenham esse nariz de batata”. Já em “Para Roma, com Amor”, leve e deliciosa comédia do Woody Allen que está em cartaz, um estudante de arquitetura (Jesse Eisenberg, “A Rede Social”) mora com uma boa moça do tipo B que recebe em sua casa, para passar uns dias, sua melhor amiga (Elen Page, a Juno, bem crescidinha), um furacão do tipo A. O dilema do jovem entre os tipos A e B rende ótimos momentos, principalemnte porque ele é orientado por uma espécie de alter ego, seu ídolo e famoso arquiteto (Alec Baldwuin – 30 Rock). Aliás, o personagem lembra o Bogart de "Sonhos de Um Sedutor", filme de Woody Allen de 1972.


A famosa atriz na frente do livreiro de esquina:
“Não se esqueça. Eu sou apenas uma garota, parada
em frente a um garoto… pedindo a ele para amá-la.”
O dilema também pode ser transposto para a crítica cinematográfica. Há filmes que nos divertem, nos grudam na tela e que podemos assistir várias vezes (tipo A) e filmes com grande qualidade artística, densos, com mensagem e que deixam uma marca profunda (tipo B). Exemplos: “Eclipse” (maravilhoso filme do Antonioni), é do tipo B e “Um Lugar Chamado Nothing Hill” (deliciosa comédia romântica com Julia Roberts e Hugh Grant) é do tipo A. Pergunta qual tem maior contribuição artística. “Eclipse". E qual vejo mais e me divirto todas as vezes? "Nothing Hill". Terceira pergunta: qual é o melhor? Não há resposta, os dois tipos podem ser bons ou ruins. No caso dos citados, os dois são ótimos.
  
Mas muitos críticos não pensam assim. Veja este trecho de uma crítica do Correio Brasiliense sobre “Para Roma, com Amor”, com o qual ele fecha a ideia que desqualifica o filme:

“Ainda que o resultado seja agradável (e dê vontade de passar algum tempo em Roma) e divertido de assistir, fica a sensação de que foi realizado ... pra "marcar tabela", como aqueles turistas que passam por 12 capitais em duas semanas pra dizer "eu estive aqui", e não para criar uma memória duradora. 

É como se ele dissesse: eu sei que fulana é linda, gostosa e sensual, mas mulher assim só pode ser vagabunda.  Ora, se o filme “turístico”, como o próprio crítico classifica, é agradável, divertido e inspira vontade de conhecer Roma, então o filme é muito bom, pois cumpre o que promete. Já o crítico, bem... Percebe-se que ele não gostou, que ele preferia que o filme fosse criasse “uma memória duradoura”. Bom, um crítico deve saber que o Woody Allen sabe criar memórias duradouras e se não o fez foi porque não quis. O filme revela claramente que quer brincar com os estereótipos ao utilizar as referências claras ao imaginário sobre Roma e sobre os italianos: cinema de Fellini, música italiana que fica entre o romântico e o brega, fama de conquistadores que os italianos tem, o romantismo, a ópera, as celebridades instantâneas e os paparazzis, e provavelmente mais um monte de referências que eu não detectei enquanto me divertia, mas que um crítico deveria ter enxergado. Quando um crítico desqualifica um filme pelo que não é e pelo que acha que deveria ser, ele age como um frustrado por não ser cineasta, age como nós, que gostamos, ou não, de um filme. Só que nós não somos pagos para trazer informações que ajudem os leitores a interpretar uma obra.

Woody Allen é como as mulheres do Djokovic, Brad Pitt e João Wainer: unem os tipos A e B. Ele, como poucos, pode fazer os dois tipos de filme, os que servem para divertir (como “Scoop”e “Para Roma com Amor”) e os que servem para deixar uma memória duradoura (“Match Point” e “Meia Noite em Paris”). Só para citar um utro capaz disso: o genial Billy Wilder tem o denso, profundo e filosófico “O Crepúsculo dos Deuses”, que está em qualquer lista de melhores filmes da história e “Quanto Mais Quente, Melhor”, a melhor comédia rasgada de todos os tempos. Filmes dos dois gêneros podem ser bons ou ruins.

Os bons críticos jamais confundem contribuição artística e densidade com qualidade. Eles sabem que a qualidade de um filme não se mede pelo objetivo do cineasta (ser divertimento leve ou um filme denso e filosófico), mas pela forma como ele cumpre o que promete. No caso de “Para Roma, com Amor”, que claramente pretende ser uma comédia leve que se propõe a fazer rir com os estereótipos italianos, e não a discuti-los, só tenho a dizer: vá ao cinema e divirta-se, como o grande público tem se divertido.
  
Aos leitores deste blógui esclareço que a diferença entre filmes e mulheres é que quanto aos filmes, o que nos importa a nós, expectadores, é que tenham qualidade. Já quanto às mulheres, o que importa a nós, homens, não é que sejam do tipo A, B ou C, mas simplesmente que nos queiram. Portanto, eu não ouso, e nem estou em posição para isso, recusar nem as lindas e sensuais, nem as inteligentes e de bom papo, muito menos as que reúnem os dois tipos, como a Alessandra Negrini, um ABC completo, a quem imploro que se inspire nos bons críticos e veja se esse fotografozinho de corpinho sarado pode, como eu, que não tenho nada além de um cérebro razoável e um bom coração, fazer aquilo a que um homem "prá você chamar de seu" deveria se propor: dar à sua vida um bom roteiro e enchê-la de luz, de planos, contra-planos e de densidade pictórica.

segunda-feira, 2 de julho de 2012

DÉRCIO MARQUES, O PRÍNCIPE DO SERTÃO


Dentre minhas inúmeras e reconhecidas qualidades, destaco a modéstia, que não apenas me impede de relacionar as demais, como me obriga a reconhecer uma das minhas famosas imperfeições: a total falta de elegância. Como é sabido, e minha amiga Estela sempre me lembra, visto roupas tão inadequadas que fazem minha barriga parecer volumosa e adiposa, mesmo sendo ela feita apenas de rijos músculos abdominais. Uso cinto bege coordenado com sapato da mesma cor, já usei celular no cinto e, quando tenho coragem, uso aquela bolsinha conhecida como capanga. Algumas amigas seguidoras deste blógui, tipo a Fernanda, sempre sutil, devem estar pensando em me dizer:
“Não é bem assim, você pode não usar roupas muito elegantes, mas elegância não está só nas roupas”
Onde mais está a elegância, então, Fernanda?
“Nos modos. Tem pessoas sem habilidade no uso das roupas, mas que tem modos elegantes”.
Ah, você está sugerindo que meus modos são elegantes?... E as incontáveis vezes em que saí de restaurantes com a camisa toda manchada de molho? Nem vou mais a restaurantes italianos por conta disso. Lembra aquela vez em que você me fez sair direto do restaurante para uma loja comprar uma camisa nova? Até me pagou a camisa!
“Amiga é prá essas coisas, não liga não, às vezes acontece...”


Sim, amigas, seguidores e visitantes em geral: falta-me elegância. Consequentemente, e para decepção geral, elegância não é o forte deste blógui. Mas não há mal que sempre dure: vou tratar já de inchê o blógui de elegânça: convidei o cantadô Dércio Marques prá dar uma passadela por aqui. E num é qui ele veio mesmo?


Primeiro, ele veio pelas memórias deste autor: 1980, ainda ditadura militar, em pleno horário nobre, os produtores da Globo quiseram reeditar os grandes festivais e deixaram rolar, por exemplo, Baby Consuelo cantar deliciosa e provocantemente “você pode fumar baseado, baseado em que você pode fazer quase tudo”. E deixaram também um tal de Dércio Marques interpretar uma música do Elomar, um grito sertanejo, agônico e carregado de revolta. Só que comigo acontece sempre. E quando convido uma mulher para jantar e, na hora de pagar a conta, vejo que esqueci o cartão? Isso é elegância? E as piadas constrangedoras que faço?


“u'a vontade aqui me dá / dum dia arresolvê / quebrá a cerca da manga / e dexá de sê boi manso / e dexá carro dexá canga / de trabaiá sem discanço / me alevantá nos carrasco / lá nos derradêro sertão / vazá as ponta afiá os casco / boi turuna e barbatão / é a ceguêra de dexá / um dia de sê pião / de num comprá nem vendê / robá isso tomem não / de num sê mais impregado / e tomem num sê patrão...”
Aí abaixo, a música com a gravação original de Dércio Marques (na capa do vídeo o autor, Elomar)


E o Dércio Marques cantou todo elegante, ao mesmo tempo leve e firme. E sua voz de trovador transmitindo dor e gravidade silenciou aquela platéia chata de festivais, como um Romarinho em La Bombonera. Foi impressionante. E ele foi prá final, mas, afinal, era a Globo, e adivinha quem ganhou o festival? Se fosse resolver, iria te dizer que foi minha aaaaaaaaaaaagonia, para alegria da Fernanda.
Tempos depois dessa verdadeira revelação que foi ver Dércio Marques, estava eu já em Brasília, em meio a uma das muitas prosas poéticas e lunares com o grande Panta, quando eu perguntei se ele conhecia o Dércio Marques. 


“Se conheço? E ele não é lá de Uberaba? Já andamos muito por esse sertão... Carlão, mais uma...”
“Carlão, mais uma”, na boca do Panta, significava, para meu deleite, “senta que lá vem história”.
Prá quem não leu um pôsti antigo deste blógui (A incrível história do CPNES - Parte 2, de julho de 2010), o Panta é aquele menino cujo pai batizou sarcasticamente de “Clube da Esquina” os encontros dos jovens Lô, Bituca, Beto e Toninho na frente da sua casa. Não, leitor curioso, não vou falar dos Beattles das alterosas. O pôsti hoje é sobre Dércio Marques, o príncipe do sertão. Pois o Panta, cansado da capital mineira, voltou às roças de Uberaba, onde no final das tardes se podia ouvir pius dos inhambus e sabiás e bois tristonhos berrando as histórias do lugar. E foi ali, no sertão de lençóis de cambraia, perfume de Assa-Peixe e moças lindas em vestidos floridos, que Pantaleão conheceu aquele príncipe de verdade, disfarçado de elegante cantador: Dércio Marques. 


Panta me contou das andanças que fizeram pelo sertão. Dércio Marques era um Villa Lobos: entrava por dentro do Brasil garimpando diamantes, que lapidava com sua voz de cantador, com a riqueza dos arranjos, com os dedilhados de sua viola e com sua elegância de príncipe que, de fato, era. Mas, veja bem, ele não era do tipo que pegava qualquer coisa, não. Pegar qualquer porcaria, botar um arranjo legal e cantar bonito e, é fácil; até o Caetano, as vezes no silencio da noite, se sentindo muito sozinho, faz, por sinal, divinamente. Dércio trazia todos os ritmos e estilos, todos os bons cantadores, não como riqueza folclórica, mas como beleza mesmo. 


Certo dia, no interior de Pernambuco, avistou, na varanda de um pequeno castelo cercado de sarsais, uma jovem donzela muito linda, mas também muito triste. O príncipe olhou para ela e sorriu, mas ela só chorava. Foi quando ele sacou a viola do lombo do cavalo e cantou uma se suas músicas mais tristes. No final da cantoria, a moça sorriu e acenou. O príncipe respondeu com um aceno elegante, guardou a viola e seguiu viagem. Panta viu que a moça tinha ficado caidinha pelo Dércio e pensou que, se fosse com ele, subia lá e agarrava a moça. Essas artistas são mesmo estranhos. Já começando a seguir o cantador mata adentro, Panta ainda teve tempo de se virar e perguntar o nome da donzela, mas não entendeu bem a resposta, pareceu-lhe que ela respondeu Neide ou Lady, talvez Cleide.


A gente nunca sabe se as histórias do Panta são reais ou não. A própria existência do Panta é questionada. Eu mesmo às vezes me pergunto, quando a razão me domina mais do que eu gostaria, se ele de fato existe ou se é uma fuga da minha mente. O fato é que ouvir Dércio Marques é viajar de primeira classe para o sertão. Tudo é lindo e calmo ali. Algumas de suas faixas instrumentais levariam até o exigente Fábio a falar “que maravilha!”, muito embora, segundos depois completasse com o indefectível “mas Pat Metheny é melhor”. 


Durou dias e dias, talvez meses, aquela noite em que o Panta me contou das viagens com o cantador mais elegante que esse sertão já viu e que culminaram com a gravação do disco do qual o Panta mais gostava: Fulejo. Pois desde que, na semana passada, eu soube que o cantador saiu para nova viagem, desta vez sem o Panta, eu tenho ouvindo o “Fulejo”, o maravilhoso “Terra, Vento e Caminho” e mais um monte de discos do Dércio Marques, o que tem me valido como uma mega injeção de paz, beleza e elegância nas veias e na alma. Desde então não tenho mais dores de cabeça.

Semana que vem, convidarei a jantar alguma linda donzela, quem sabe a Donzela dos Sarsais, que a esta altura certamente já é uma Senhora dos Sarsais, para jantar comigo num restaurante italiano. Sairei de casa tão elegante que até a Estela aprovaria. E mais: aposto com quem quiser que não esqueço o cartão do banco e que saio do restaurante de camisa limpa. Quanto às piadas constrangedoras... bem, ninguém é perfeito.  


E, para fechar este pôsti do modo mais elegante, nada como ver uma entrevista do próprio Dércio Marques falando sobre música e sobre seu papel.


Blog Widget by LinkWithin