domingo, 13 de novembro de 2011

O TERROR DAS MULHERES


Desde tempos imemoriais as mulheres nos aterrorizam com aquele jeito de inalcançáveis, de senhoras de si, bafejando aquele insuportável ar de segurança. Até no primeiro beijo, a que as meninas dão (ou davam?) tanta importância, e que poderia causar alguma insegurança, elas são mais seguras que os homens. É óbvio que o jeito “não tô nem aí” dos meninos é puro engodo. Não é que os meninos tivessem medo do beijo, mas tinham um enorme medo das mulheres, de não agrada-las, de fazê-las correr a outro que as beijasse melhor.

Ô, mulata assanhada
Que passa com graça
Fazendo pirraça
Fingindo inocente
Tirando o sossego da gente 
(Ataulfo Alves)

O jeitinho lépido e saltitante com que as meninas, arrebitadas, passam à nossa frente, nos arrebata e ao mesmo tempo causa terror. Terror à rejeição. Ah, tem um homem seguro lendo este pôsti que agora está pensando “comigo isso nunca aconteceu, mulher nunca me aterrorizou”? Santa inocência, santa ignorância, santo auto-engano. O medo da rejeição da fêmea constitui a base do instinto agressivo do macho e da própria negação desse mesmo medo.
A mãe natureza (olha só, até a natureza é mulher) fez com que as mulheres escolhessem os homens, e isso nos colocou, a nós, homens, desde que o mundo é mundo, em posição de inferioridade e insegurança: dependemos de sua aprovação, e qualquer ser humano que dependa da aprovação de outrem, fica inseguro, porque não depende só de si, mas do julgamento do outro, da outra, no caso. .


Bonequinha de Luxo, com Audrey Hepburn representando a mulher acessível (no sentido de que Holly era uma mulher que todas poderiam ser), inventou a mulher moderna: que podia ser independente, ficar linda com apenas um pretinho básico – também inventado pelo filme, e livre para amar – ou para fazer amor. Depois desse filme, a situação do homem piorou ainda mais, porque as mulheres ficaram ainda mais interessantes e mais desejáveis (quanto mais alto o vôo – ou o desejo, maior o tombo - e o medo da queda). As bobagens da “revolução sexual” e do feminismo tentaram, felizmente em vão, destruir isso, descendo a mulher do seu pedestal. As feministas (praticamente um eufemismo para feias invejosas) reclamaram até da propaganda da Gisele Bündchen. 

* Aqui um adendo, não para ser politicamente correto, mas para evitar má interpretação: mulher é feia ou bonita muito mais pelo “uso” que faz de si mesma do que por condições físicas naturais. Feministas não gostam de passar com “graça fazendo pirraça” e não querem “aderir” à feminilidade que chamam de cosmética (mas que Eva já tinha, ou seja, é natural), e por isso não tiram o sossego da gente e acabam sendo feias à vista do homem, hétero ou não. E quem são as bonitas? Bonitas, ora, são as simplesmente bonitas (outro dia li: que bom que Vinícius foi de um tempo livre da chatice do politicamente correto e pôde escrever “desculpem as feias, mas beleza é fundamental" – hoje seria processado). E já que falei dos homens não héteros, devo falar também das mulheres que não passam “com graça fazendo pirraça” por não terem interesse nos homens: imagino que, sem perder sua beleza, também prefiram as mulheres que passam com graça fazendo pirraça.

desce do trono, rainha

desce do seu pedestal

(Arnaldo Antunes)


Pura lógica: se a mulher descesse do pedestal, ficariam menos inalcançáveis, mais acessíveis, por conseqüência menos desejáveis, e os homens não se sentiriam tão inseguros (quanto mais baixo o vôo – ou o desejo, menor o tombo – e o medo da queda). Neste ponto, a leitora curiosa da alma masculina (sim, os homens têm alma – porque só se fala em “alma feminina”?) deve estar se perguntando: afinal, o que preferem os homens, que a mulher desça do trono e se sintam seguros, ou que ela permaneça lá, linda, causando terror?

A resposta é dada por Jerry Lewis, o mais refinado palhaço que este mundo já viu num filme que fez sobre esse terror que as mulheres provocam nos homens, ao menos aos sinceros. O genial Jerry Lewis presenteou a humanidade com uma jóia rara e singular: O Terror das Mulheres. Nele, JL é Herbert H. Heeber, um tímido que após uma desilusão amorosa (rejeição), passa a sentir verdadeiro terror ante as mulheres, foge de sua pequena cidade e cai, sem saber, numa pensão de mulheres, não qualquer pensão de mulheres, mas numa pensão de mulheres que iniciam na carreira artística: atrizes, instrumentistas e modelos, ou seja, uma pensão cheia de beldades que “passam com graça fazendo pirraça”, justamente o que mais aterroriza Herbert. 

E Jerry Lewys faz um filme tão belo quanto a beleza que ele quer retratar. Como ator é um palhaço refinado que, com o corpo e com expressões faciais, ilumina o espetáculo. Como diretor é um jazzista, também refinado, capaz de criar uma mise-em-scène (não existe, acho, expressão em português para isso) como a que se pode ver no link mais abaixo. 

O cenário que ele criou lembra o de Janela Indiscreta, mas todo no interior de uma mansão. Veja a cena abaixo. É o primeiro amanhecer de Herbert na pensão. Os movimentos são perfeitamente encaixados na música, numa maravilhosa coreografia não dançada, com os instrumentos representando os personagens e a câmera sempre bem posicionada (atenção à ótima tomada em que, em primeiro plano a primeira mulher ajeita a meia e em segundo plano, outra, bem diferente, repete o movimento).





E como esse filme responde à questão colocada pela leitora curiosa da alma masculina? Afinal, os homens preferem a mulher que passa fazendo pirraça e atormentando o coração da gente ou aquela que lhe dá segurança?
Antes da resposta final, um brinde: duas cenas do filme. Na primeira, Jerry Lewis brinca com o homem seguro, o chamado homem com H, machérrimo. É uma cena de ação e reação, quase sem palavras, que acaba com um “atrás da porta” à Lubitch.

Na segunda, uma homenagem ao cinema, eu que Lewis ao mesmo tempo homenageia um seu ídolo e realiza algo como um sonho pessoal, num lindo brincar de cinema, mostrado com beleza e elegância. Por algum motivo, não consegui puxar o link prá dentro do blógui, mas este é o link:
Afinal, o que preferem os homens? 

Herbert tenta fugir da pensão várias vezes, afinal, aquelas dezenas de mulheres lindas o atormentam demais. Mas não consegue, porque elas o impedem (ele as ajuda muito nos afazeres cotidianos). No final, elas deixam de impedir que ele se vá. Ele vai? 

É claro que a questão que levantei e coloquei na boca da leitora curiosa é falsa. Mulher nenhuma, especialmente a que passa com graça fazendo pirraça, como é o caso das leitoras deste blógui, tem essa dúvida, caso contrário não passariam com graça fazendo pirraça, atormentando o coração da gente. 


Herbert fica, é óbvio, feliz da vida. Feliz e profundissimamente atormentado.

Um comentário:

Ana Lúcia disse...

Eu AMO esses seus assuntos de post! rs...

bjsss

Postar um comentário

Blog Widget by LinkWithin