domingo, 5 de agosto de 2012

DEIXE DESSE CHORORÔ, BRASIL


Deixe desse chororô, isso nao leva a nada, já cantou Ednardo.


Acostuma-te à lama que te espera, escreveu Augusto dos Anjos.


Somos perdedores, escreveu o Tio Moa. 


Estamos todos no esgoto, mas alguns entre nós olham para as estrelas, escreveu Oscar Wilde! Oscar Wilde, por sinal, era britânico, mas não inglês e sim irlandês, o que deve equivaler, no primeiro mundo Bretão, a ser nordestinos de Minas prá baixo, a ser pontepretano na séria A do brasileirão, a ser negro nas plagas gauchescas (gauchos só não são preconceituosos com homossexuais, por motivos óbvios). 


O fato é que Oscar Wilde, um esteta, famoso nos circuitos artísticos, adorava festas, badalações e meninos bonitos. Foi preso, julgado e condenado por seus desvios morais (o negócio dele nunca foi a moral, mas a estética). O sociedade se afastou dele. Depois de cumprir a pena, foi morar só em Paris, num apartamentinho minúsculo. Contraiu sífilis, depois meningite, doença esta que, por sinal, já passou duas vezes pelo frágil e debilitado corpinho do Tio Moa, quando este ainda tinha um corpinho. Com a medicina mais de setenta anos mais avançada do que na época de Wilde, Tio Moa não morreu. Wilde sim, mas antes de morrer fez a opção de não sentir dor, de viver seu final com dignidade estética, enchendo-se de ópio, curtindo até o final os prazeres da vida, cujo maior, para ele, era beber champanhe. Morreu assim, sem dor, com sofisticada embriaguez e bem vestido. Morreu, enfim, olhando para as estrelas.


Este deveria ser o caso dos brasileiros derrotados em Londres e também o nosso, brasileiros frustrados com o ouro esperado que não veio. Todos deveriam tomar champanhe e olhar para as estrelas no lugar de ficar choramingando esse chorozinho ralé de sarjeta. Ninguém tem obrigação nenhuma de ganhar, sobretudo num país sifilítico em termos de educação, de esportes e de ética. Os EUA ganham tudo porque eles tem educação (e educação compreende o esporte). Vejam que não há um único filme americano com crianças e adolescentes em que não apareça uma cena em que eles estejam praticando esportes na escola ou na faculdade. Até o ótimo Carrie, a Estranha, o original, é claro, tem cena de prática de esporte na escola. O cinema reflete a realidade. Lá é cotidiano, faz parte da educação e da cultura deles. Não faz parte da nossa. Não é normal que ganhemos medalhas.


No lugar de esperarmos medalhas e de apoiarmos, como infelizmente fazemos, os discursos oportunistas de que “precisamos investir pesado nos atletas para ganhar olimpíadas aqui”, deveríamos cobrar investimentos em educação de qualidade, o que compreende forte estrutura esportiva em cada escola, em cada faculdade, para que daqui a trinta, quarenta anos, comecemos a curtir os frutos dourados, de modo natural. As americanas do vôlei são favoritas ao ouro, e lá não tem vôlei profissional, só nas universidades. 


Nosso país é assim, não tá nem aí para a educação. Quantos livros os jovens brasileiros leem por mês?  Por ano? Na vida? O esporte é consequência da educação. Nossas vitórias são exceções, devem-se a raríssimos e talentosos lutadores que conseguiram enfrentar todas as dificuldades. Ganhar ou não ganhar reflete o quanto valorizamos o esporte. Gostamos de quais esportes? Futebol, e nisso somos mega vencedores. Também gostamos de vôlei, e sempre ganhamos. Mas quem está aí para atletismo? Para salto com vara? E ainda assim, achamos um absurdo que a saltadora e que os irmãos Hypólito tenham amarelado e que as judocas tenham perdido suas lutas. Ficamos bravos, ironizamos. Eles deviam responder “Ah, vá te catar! Errei e acabou, ninguém tem nada com isso”, e não tem mesmo. A saltadora Fabiana Murer, ao menos, não se abalou. Não saltou e pronto. Amarelou e pronto. Foi mais ou menos isso que ela disse, perfeitamente sóbria. 


Porque vários atletas brasileiros ganham mundiais, são primeiros no ranking, mas amarelam nas decisões? Primeiro porque são brasileiros, latinos, sangue quente, emocionais. Segundo, porque ganham quando nenhum brasileiro tá olhando, já que não ligamos para os esportes que praticam, só vemos as olimpíadas. Finalmente, amarelam porque nas olimpíadas sentem a pressão, sabem que lutaram contra tudo e contra todos para estarem entre os melhores do mundo, trazem o complexo de vira-latas de toda uma nação e carregam ainda por cima essa pressão de um povo louco para que as vitórias apaguem nossa pobreza esportiva, ética, educacional, política. Obrigamos nossos atletas a nos darem, de bandeja, a autoestima de que tanto precisamos. 


Por isso eles choram quando perdem e também por isso choram quando ganham. Quando perdem é de medo dos vampiros brasileiros, loucos por medalhas que não são suas. Quando ganham o choro é mais de alívio que de alegria. Nem os vencedores curtem seu momento, o que se comprova na infalível afirmação que todos fazem: “a ficha ainda não caiu”, ou “agora tudo no Piauí vai ser diferente”. Vejam as americanas no pódio: sem choradeira, estão lá felizes, curtindo seu momento de sucesso, aproveitando. Já viu algum americano falar que “agora em Massachussetts tudo vai melhorar”? O que os americanos e assemelhados sentem no pódio é alegria, não é redenção. 


Mas quer saber de uma coisa? Nós somos assim e ponto. Cada um com o seu cada qual: assim é na vida, assim é nos esportes. O esporte é legal porque reflete o que é um país. O quadro de medalhas mostra exatamente o que somos, e só não vamos pior por causa das raras exceções, dos talentos individuais. Esses atletas brasileiros, tanto os vendedores quanto os perdedores, na real, valem muito mais que os Phelps, porque nadam contra a corrente, em rios barrentos, e não em piscinas limpas e climatizadas. O dia em que tivermos na educação e nos esportes os valores básicos da nossa sociedade, o que na verdade duvido que aconteça, teremos nossos Phelps. Mas se não acontecer, azar. Não temos na nossa cultura o espírito vencedor. E quem precisa disso para ser feliz? As estrelas estão aí, o céu é para todos.


P.S. A propósito: a Ponte Preta, emérita vira-latas da pela série A do campeonato Brasileiro, acaba de vencer, em plena Belo Horizonte, o poderoso Cruzeiro, cujo símbolo são as cinco estrelas que guiaram os Reis Magos. 

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