Está em cartaz nos cinemas o filme "A Riviera Não é Aqui". Fui ver. Vejam como é a história: numa tentativa desesperada salvar seu casamento com a bela Julie e tirá-la da depressão, o funcionário público Philippe tenta realizar um sonho do casal, com sua transferência para um lugar maravilhoso, a Riviera. Para isso comete uma fraude, é descoberto e transferido para o outro extremo do país, um lugar frio, inóspito e com uma população rude, que mal fala sua língua. Pior: terá que ficar lá por dois anos e sem sua esposa e filho. Com seus sonhos destruídos e sozinho, ele parte para a sombria Berges. O filme aborda ainda outros temas pesados, como o preconceito, a mentira e o alcoolismo.
Você, que já está pensando em fugir do filme, não sabe da maior: o filme é francês! Pronto, fugiu... Esse nunca mais volta a ler o blog!
Falo então para você, que ainda está lendo: continue (já conseguiu até aqui...). Pela história o filme poderia parecer mesmo um dramalhão, mas é um daqueles raríssimos filmes que te fazem rir o tempo todo. Não como a maioria das comédias que você ri muito no começo, depois o ritmo vai diminuindo, diminuindo, até virar uma comedia romântica morninha no final. Este, ao contrário: é engraçado no começo, mas o ritmo vai aumentando cada vez mais e quando passa da metade do filme, aí você pode não parar mais de rir. A não ser em alguns momentos, para chorar com alguns momentos emocionantes.
O filme tira a sua graça primeiramente das ótimas atuações do elenco, que parece talhado para a comédia. Kad Merad, que faz o atrapalhado protagonista, é fantástico e faz rir mesmo quando o texto não traz uma piada.
Depois, a graça vem da incrível familiaridade que sentimos com as pessoas, com a situação e, inclusive, com a empresa em que quase todo o elenco trabalha (La Poste, o correio da França). Parece que estamos em casa, tudo é simples, a gente, o cotidiano, as situações. O cinema também é simples, não há um roteiro complexo ou sinuoso, não há uma direção elaborada, não há, enfim, efeitos ou pirotecnia. É um cinema simples, extremamente simples. E essa simplicidade, que não se opõe à beleza, é uma bela opção para o cômico (lembrar personagens de Chaplin e Jerry Lewis).
Por fim, essa comédia se constrói com o choque cultural. Assim como os aspectos divergentes vão surgindo, dando graça, eles se dissipam, com mais graça ainda: primeiro, a fala muito diferente da região, depois as comidas, os costumes do povo, a bebida, e por aí vai. Com a queda, uma a uma, de todas as diferenças, o preconceito e a visão distorcida que se faz de um povo que mal se conhece, se transformam em cumplicidade, em comunhão.
Como num bom filme do Jerry Lewis, “A Riviera...” é recheado de pequenas pérolas, como a cena da descoberta da fraude, a da multa na estrada ou a do marido contando para a esposa e amigos como é dura a vida no norte. Outras tocam, como a que apresenta os carrilhões de sinos ou a do pedido de casamento. E prepare-se, porque algumas longas seqüências provocam dor no abdômen, daquelas em que toda a platéia ri a plenos pulmões: o chefe acompanhando o carteiro no distrito e a recepção da esposa na cidade.
Mesmo com a melhor qualidade que uma comédia pode ter, fazer rir, “A Riviera Não é Aqui” não se limita a isso: fala de temas como aceitação, amor, amizade e equipe. O sucesso do filme está ligado ainda a outra coisa, tão ou mais importante: ele fala de algo que nos atormenta a todos - a eterna contradição entre nossos sonhos (nossas Rivieras) e a nossa vida real (nossos simples "aquis"). Mas quem diz que nossos sonhos são bons? Nós queremos um lugar ou um estado de espírito? O que é um lugar bom? O Wander Wildner dá a dica: quer um lugar onde a cerveja seja barata, as pessoas ouçam Beatles, sejam loucas e super chapadas - "Um Lugar do Caralho!". O filme, sem pieguice, só com graça e bom humor, parece dizer que algo parecido: a "Riviera" é bem aqui, sim senhor.
Um comentário:
depois de 4 anos, foi demitido...
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